domingo, 2 de agosto de 2009

Sexualidade: A construção e manutenção social de um tabu


Enquanto no reino animal irracional as funções sexuais são determinadas fundamentalmente pelo instinto, a sexualidade humana se manifesta através de padrões culturais historicamente determinados, donde sua dinamicidade temporal e diversidade espacial e performática. A sexualidade humana é uma constructo cultural, tanto quanto os hábitos alimentares e corporais. Nascemos machos e fêmeas e a sociedade nos faz homens e mulheres. Mais ainda: o ser masculino e o ser feminino variam enormemente de cultura para cultura, modificando-se substantivamente ao longo das gerações dentro de uma mesma sociedade.
A história do sexo e da sexualidade humana está diretamente ligada a história da evolução do homem. Por exemplo, acredita-se que o homem (neandhertal) adquiriu o hábito cobrir o corpo (vestimentas), primeiramente para se proteger do frio, do sol, e do ataque de animais e de outros homens, há cerca de cem mil anos. Parece que havia uma maior preocupação em cobrir os genitais masculinos, já que eles ficavam expostos a lesões que poderiam atrapalhar a reprodução.
O sexo era parte importante na vida dos antigos. Nem sempre os órgãos sexuais eram considerados obscenos, mal sendo cobertos em alguns países. As decorações das cerâmicas cretense, fenícia, minóica e grega, que são o retrato dos costumes daqueles povos. Essas decorações, retratam os fatos da vida cotidiana repletos de motivos sexuais, onde homens e mulheres, ninfas e sátiros, se divertem brincando, dançando, tomando banho e tendo relações sexuais, em cenas registradas por artistas. A nudez era exaltada pelos gregos; havia uma tendência ao bissexualismo. Já os romanos, não eram tão adeptos da nudez, no entanto, suas festas bacanais, tão famosas, tiveram que ser proibidas por terem se tornado violentas e obscenas. Isso aconteceu por volta do início da era cristã, onde, em Roma, já havia uma forte tendência para os preconceitos sexuais, considerando quase tudo pecado. Ainda assim, a prostituição, cujas mulheres originavam-se de todas as camadas sociais, era a instituição florescente.
Antes da idade média, a virgindade era pouca valorizada. Acredita-se que ela começou a ganhar importância, entre os séculos IV a XV, quando os membros das classes ricas, passaram a atribuir-lhe valor de troca comercial e econômico; assim, quando os homens começaram a pagar dotes e a exigir a integridade da “mercadoria”, a virgindade começou a ganhar importância e a ser sinônimo de status em todas as camadas da sociedade.
As religiões também tiveram, e sejamos justos, ainda têm um importante papel na formação do comportamento do ser humano, principalmente sexual. A idéia de pecado, passada ao longo das gerações, é extremamente aversiva. Assim, questões como o adultério, o homossexualismo, a masturbação, a virgindade, a castidade, a poligamia (permitida em algumas religiões), o casamento, o divórcio também sofreram algumas modificações com o passar dos tempos, e ainda são assuntos que causam grande controvérsia.
Assim, os costumes dos vários povos, dos mais primitivos aos mais civilizados, influenciados por suas correntes filosóficas, foram decisivos para o estabelecimento de normas de conduta para o comportamento humano. É por isso que se costuma dizer que todo o comportamento, inclusive o comportamento sexual, é o resultado dos fatores culturais, religiosos, políticos, econômicos, étnicos, sensoriais, regionais, climáticos e de sobrevivência de uma época.
Todos esses fatores levaram a uma definição convencional de como a sexualidade humana deve ser vivenciada. Culturalmente se reconhece o sexo convencional como sendo heterossexual, com finalidade prazerosa e/ou procriativa, momentaneamente monogâmico.
Tradicionalmente, essa condição de convencionalidade é utilizada como sinônimo de normalidade e esta, por sua vez é utilizada como sinônimo do que é certo ser feito.
Mas, quando surge um comportamento que diverge dessa norma? O que fazer?
Os transtornos da sexualidade
Parafilia é o termo atualmente empregado para os transtornos da sexualidade, anteriormente referidos como "perversões". No Âmbito dos transtornos associados à sexualidade, ela diz respeito, especificamente, ao transtorno de preferência sexual.
A Parafilia, pela própria etimologia da palavra, diz respeito à "para" de paralelo, ao lado de, "filia" de amor à, apego à. Portanto, para estabelecer-se uma Parafilia, está implícito o reconhecimento daquilo que é convencional (estatisticamente normal) para, em seguida, detectar-se o que estaria "ao lado" desse convencional.

É preciso considerar então, que no campo da saúde, e mais especificamente da saúde mental, o termo normal tem uma conotação estatística, predominantemente, ou seja, normal é o mais freqüente, mais usual, mais encontrado e, neste caso, não-normal nem sempre significa, obrigatoriamente, doença.
Assim sendo, dar a determinado comportamento o rótulo de anormal, desviante, patológico, problema ou transtorno de sexualidade é preciso, que no mínimo atenda a dois critérios. Primeiramente, que ele se constitua em algum acontecimento incomum, ou seja, estatisticamente não-normal e, em segundo e principalmente, em algum acontecimento capaz de causar sofrimento ou prejuízo na pessoa ou em outros, isso porque a morbidez (sofrimento) é um atributo que não deve acometer apenas o paciente, como em outras especialidades médicas, mas deve estender-se aos demais, às pessoas que lhe são próximas. Alguns pacientes psiquiátricos não experimentam sofrimento, mas proporcionam sofrimento aos demais.
Nessa área como em muitas outras é difícil determinar onde acaba a sexualidade saudável e começa a patológica. Isso porque, as preferências sexuais idiossincráticas podem parecer excêntricas para as pessoas que delas não participam, mas podem ocorrer sem representar nenhum problema para o indivíduo, facilitando seu prazer ou simplesmente, introduzindo um elemento ritualístico acessório à atividade sexual essencialmente normal.
Na primeira versão do DSM, de 1952, desvios sexuais foram agrupados juntamente com personalidade psicopática, consistente com a crença de que a maioria dos comportamentos sexuais desviantes eram ofensas legais praticadas por pessoas com tendências anti-sociais e criminais (homossexualidade estava incluída nessa classificação)
Somente em 1980 com a versão III do DSM, é que os até então classificados como desvios sexuais ganharam uma categoria própria chamada Parafilia, enfatizando que o desvio (para) está relacionado com o objeto da atração sexual (philia).
No caso do CID-10, a categoria equivalente à parafilia denomina-se transtorno de preferência sexual.
Alguns teóricos acreditam que houve uma tentativa de entrar em harmonia com as mudanças de estrutural moral da sociedade, promovidas, principalmente pela revolução sexual nas tendências e comportamentos pós-anos 60. Assim, buscou-se uma clarificação dos critérios diagnósticos da conduta desviante e uma exclusão gradual de atividades assentidas entre parceiros.

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